Enquanto cavalgo o tiranossauro cibernético cuspidor de fogo e o meu corpo se convulsiona pelos espasmos pré-orgásmicos concedidos pelo sexo oral de elevada qualidade proporcionado pela amazona boazona e sensual, reflicto como pôde a sociedade, o mundo, a Humanidade!, mudar em tão pouco tempo. Uma pandemia, uma única pandemia, tão rápida e brutal quanto cínica e eficaz, foi tudo o que bastou.
Pois que ainda há pouco mais de duas semanas organizava faxes não solicitados em ortogonais capinhas coloridas que colocava depois por ordem alfabética nas estantes do escritório, enquanto o meu chefe, doutor José Augusto, se vangloriava dos seus dois meses de férias passados em Jericoacoara e ruminava como iria comprar o segundo Tesla modelo S, se a pronto pagamento ou requisitando novo crédito ao seu tio gestor de balcão no segundo maior banco nacional, enquanto eu me preparava para a viagem de comboio de hora e meia para regressar a casa, onde me aguardava uma refeição de bacalhau com natas do Minipreço e masturbação solitária até adormecer no sofá carcomido da sala.
Mas tudo mudou, há quanto, duas, três semanas? Tão rápido, tão imediato. E foi ontem, ou anteontem (quem sabe, agora toda a noção de tempo foi perdida) que voltei a ver o doutor José Augusto, a rastejar pela lama, uma perna partida de onde ressaltava parte do fémur por através de uma ferida pútrida e nauseabunda, a pedir, suplicar, por ajuda, por um copo de água, por uma centelha de humanidade neste mundo destruído e desconhecido... Sorri e enfiei-lhe dois cartuchos da Cátia, a caçadeira de canos serrados, pela goela abaixo, enquanto me ria, ria muito, dos seus olhos esbugalhados. O doutor José Augusto, disse-lhe, não devia ir embora mais cedo no dia vinte e quatro de Dezembro enquanto os funcionários da empresa continuavam a laborar até à normal hora de fecho, que depois ainda tinham de ir para o comboio da linha de Sintra...
Uma alteracação profunda e barulhenta desvia a minha atenção para nordeste. No horizonte, resta ainda a nuvem atómica da deflagração. O céu é agora pintado de vermelho e húmido das nuvens pesadas. Há uma horda de hediondos bicharocos a correr atrás de um grupo de humanos, e na frente de todos eles, a chorar baba e ranho enquanto se defeca pelas calças abaixo, reconheço o Zé, o meu tormento dos dias do liceu. Parece que hoje Cátia voltará a beijar os mortos, e não serão apenas os disformes e horrendos mutantes que salivam por ali. A amazona boazona e sensual terminou, com toda a perícia e habilidade, a dádiva a que se havia proposto, e deixa bem claro, por gestos - que neste mundo até os idiomas se perderam - que haverá mais, muito mais, que ela me irá conceder nesta noite, inclusivamente quando a sua amiga se juntar a nós. Como é que pode ela ser tão bela e impecavelmente maquilhada? Como é que mantém tão soberbos seios? Tantas questões que terão de ser profundamente reflectidas para mais tarde, pois nesse momento o Zé, esse Zé da turma do décimo primeiro J, tropeça a meus pés, também ele a suplicar por clemência, também ele de olhos esbugalhados. Tem agora uma barriga enorme e perdeu um dos dentes incisivos da parte de baixo, enquanto eu ganhei poderosa musculatura e deixo cair as longas madeixas selvagens pelas costas abaixo.
Rio, rio muito. A amazona boazona e sensual prepara-se também ela para a batalha, com os músculos retesados, os glúteos empinados. A Cátia prepara os seus lábios.
Vai ser uma boa vida.
Lavei a casa de banho a fundo. Já estava a precisar.
Há um episódio do Texas Ranger no qual o Walker é atacado por um urso, e sendo esta série uma ode masturbatória às capacidades bélicas do Chuck Norris, supõe-se que o bicho não está ali para um abraço mimoso à Ursinhos Carinhosos, e que rapidamente vai partir para cima do ranger e ser pulverizado em pó por um único e extraordinariamente poderoso pontapé rotativo. Reflectia eu que seria indubidavelmente assim, quando o Chuck derrota o urso com um único olhar fixo.
...
Antes de continuar, vou confirmar o atrás descrito, só para terem a certeza que o vosso cérebro não foi catapultado para o espaço sideral: ao ser atacado por um bicharoco com força para lhe arrancar a cabeça à patada, o McQuade não contra-ataca com uma caçadeira ou com o referido rotativo, suponho que pelo facto do rotativo do Chuck Norris ser uma demonstração de energia em tudo superior aquele flato inconsequente do Big Bang e que encontra paralelo somente no rotativo em esparregata do Van Damme, e é por isso que estas duas almas nunca se encontraram em filme, com as insofismáveis provas científicas a demonstrarem que os dois estarem na mesma sala seria o suficiente para destruir todo o Universo... Mas com um olhar fixo!
Foi a partir desse momento que cresceu em mim o superior objectivo de Vida de conseguir, não reproduzir sine qua non, só para enfiar aqui uma expressão em latim que dá a ideia de ser um gajo todo culto e espectacular, o olhar fixo do Chuck Norris, objectivo esse claramente muito acima das minhas, ainda assim consideráveis, capacidades, que isto do Chuck Norris sabe-se que basta olhar por mais de dois segundos para qualquer pessoa, objecto ou animal para todas as donzelas num raio de cinquenta quilómetros perderem a virgindade, mas reproduzir em qualquer outra pessoa, ipso facto, o mesmo efeito de abandono e perplexidade que o pobre do bicho sentiu. E após uma prolongada estadia na Lusitânia americana, i.e., o Brasil, consegui.
Não sei quem inventou essa patranha do turismo ser uma alavanca para a simbiose da História, Cultura e Tradição, dos países e respectivos povos, provavelmente o mesmo génio de marketing que nos tenta há anos convencer que os coldplay são uma banda de música, porque a acreditar em toda a gente, o único interesse noutros países e respectivos povos é saber se as naturais do país são jeitosas/bonitas/engraçadas/boazonas, ou outro adjectivo equivalente. E também não sei quem inventou a patranha da grande beleza e sensualidade da mulher brasileira, provavelmente o mesmo gajo dos coldplay, que confundiu o catálogo da Victoria's Secret com um postal do Rio de Janeiro, porque as mulheres brasileiras são, globalmente falando, e numa palavra, feias. E é aqui que alcanço esse objectivo tão profundo a que me submeti, ao revelar que, na verdade, e ao contrário do que a Globo, Record e Playboy nos impingiram, as canarinhas são, em duas palavras, muito feias, e assisto ao abandono e perplexidade no rosto de quem comigo parlamenta. A sério?!, perguntam. A sério, respondo.
Não é polémico afirmar que o Brasil é um caldeirão genético francamente fodido de sementes indígenas, europeias e africanas, e esperar que de tamanha mistelga saia algo de jeito, é o mesmo que largar um elefante com o cio no meio de uma loja de tintas com todo o catálogo da CIN, e esperar que da criatividade do animal saia um novo retrato da Mona Lisa. Os taradinhos da Criação podem berrar que nisto dos seres humanos quem mais ordena é Deus, e que Deus não falha e que por isso somos todos tão bonitinhos, mas é passar os olhos pela Bíblia para perceber que lá o Todo Poderoso se pode considerar um Cristiano Ronaldo da Vida, i.e., sou tão bom, sou mesmo o melhor, não existe ninguém como eu, e etc., mas quem olhe para a desgraça em que anda o mundo topa logo que o Jeová é no máximo um daqueles jogadores da bola que por uma vez lá se lembra de fazer um chapéu ao guarda-redes, jogada da qual nem sabe como fez, passando o dia seguinte a ser entrevistado por todos os taradinhos da Comunicação Social como se fosse a segunda vinda de Cristo e o resto da vida a ser sumariamente ignorado.
Suponho que após duas semanas no outro lado do mundo devia haver mais experiências a relatar que somente a volumetria, elasticidade e capacidade de resistência à gravidade dos seios brasileiros, imagino que haja aquilo da História, Cultura e Tradição, mas essas são coisas fundamentalmente mariquinhas que precisam de tempo e conhecimento técnico específico para serem devidamente desfrutadas, e que ainda por cima não se prestam a explicações fáceis. Tudo isto enquanto um par de seios pode, e deve, ser universalmente apreciado em todos os meus múltiplos pontos de fascinio. E depois, nada me garante que quem me recorde a história do seu povo e país faça alguma ideia do que está para ali a falar. Se perguntarem a um português quem foram os Habsburgo, é provável que se meta a a falar em alguma equipa alemã cilindrada pelo Benfica esta época, e não naquelas gentinhas que aqui há alguns séculos andaram a fazer caca pelo país até serem postas a correr daqui para fora, o que simboliza não mais que a mais retumbante derrota de todas as sucessivas políticas de Educação deste país. Que esse português não saiba da História de Portugal e de quem foram os Habsburgos, é-me igual, agora que não saiba que os cilindrados pelo Benfica este ano foram os ingleses do Everton e as francesas do Marseille, e não nenhuns alemães, isso é imperdoável. Isso é gente de ralé baixa. É gente que devia ser enfiada numa masmorra a sofrer um castigo doloroso e cruel. Como um olhar mesmo muito fixo do Chuck Norris. Alea jacta est!
Há coisas em que realmente uma pessoa nunca pensa, porque isto de ter uma crise do malvado do Chron mais parece que estamos infectado com um ovo da Ninhada, ou daquele bicharoco feio, o Alien, e que o nosso factor de cura está a fazer horas extraordinárias para o dissolver.
Há sempre um momento na minha vida em que alguém me tenta convencer que há quem esteja muito pior. Assaz, concedo, não devo jamais esquecer quem trabalha no Pingo Doce e é obrigado a levar com aquela história do, goste ou não, e não gosta, de certeza que não gosta, venho ao pingo doce de janeiro a janeiro, pelas oito horas do expediente. Música no mesmo sentido em que o estardalhaço provocado por deixar cair ao chão todo o serviço da Vista Alegre da minha mãe poderia ser considerado música, i.e., nenhum, e contagiante no mesmo sentido em que uma gripe, gripe normal, gripe de macho, não essa mariquice de nova gripe que anda para aí a ser alardeada como a nova peste bubónica e se está a revelar não mais que um flato, incómoda, sem dúvida, mas inofensiva, pode ser considerada contagiante. Ou contagiosa, sim, se por acaso quem me lê perceber que estou a deturpar o sentido dos termos para melhor encaixar a dicotomia música do pingo doce, i.e. gripe, i.e., contagiante/contagiosa, pode fingir que está a ler um texto do Eça de Queirós e escrever uma tese de pós-doutoramento sem nenhuma relevância no actual contexto sócio-económico acerca da deformação do significado dos termos enquanto potenciador da expressividade do artista. E se quem lê considera que estou a ser um idiota ao comparar-me ao Eça, pode também fingir que está a ler um texto da Linda Reis e que reencarnei o imortal poeta tal como a stripper encarnou a não tão imortal princesa Diana. E olhem que a Linda Reis até foi ao programa do Herman à pala disso, enquanto eu me fico por uma participação de exactos vinte e quatro fotogramas num filme do Mário Augusto e de rigorosos alguns segundos num sketche do Contra, portanto alguma isso da reencarnação coisa deve render. Vou apontar na agenda para mais tarde verificar. Tudo é mais fresquinho, tudo tem mais sabor.
Há integrantes numa sociedade democrática e como tal com uma opinião igualmente válida tarados que acreditam o Homem nunca ter estado na Lua e a Terra ser mesmo plana, e se parece o género de teoria da conspiração para a qual a Internet é terreno fértil, esta Flat Earth Society existia mesmo antes de William Gibson cunhar o termo ciberespaço em Neuromancer.
Roy Prol, que garantidamente não será membro dessa tão desnecessária seita, desenhou um vídeo no qual mostrou como seria a Terra e as suas principais cidades se o nosso planeta tivesse anéis como Saturno. Não que a ideia seja assim tão original, tanto nos livros Dune o planeta capital do Império é rodeado por anéis, como teorias científicas apontam que a Lua se teria formado a partir de uma cintura de anéis que em tempos rodeou o planeta.
As imagens partem de bases bem científicas, a colocação dos anéis em paralelo ao equador, as diferentes visões que o ângulo de curvatura iria provocar, as forças de gravidade necessárias para deixar a cintura estável, e ainda deixam muito espaço para a imaginação que o autor nem toca, basta pensar como qualquer religião tentaria justificar uma presenção tão incrível no Céu.
Há quem considere videojogos produções febris de uma indústria alicerçada no delírio juvenil, com constante bombardeamento sensorial e histórias baseadas em clichés supérfluos e com a espessura da minha folha de salário, mas é apenas uma questão de percepção das diferentes camadas de contexto, conhecimento das variadas estruturas de composição, e assimilação da simbologia metafórica.
Afinal, o Pac-Man nunca foi acerca de um bicharoco amarelo a ser perseguido por fantasmas enquanto comia bolinhas, mas sim o drama de um astronauta acossado pelos espíritos dos que morreram para lhe permitir continuar a missão, e se refugia nos ansiolíticos enquanto vaga perdido nos espaços por entre sistemas solares. Se isto era apenas um dos primeiros video-jogos, imagine-se a profundidade que pelos nossos dias qualquer Gordon Freeman pode alcançar.
Através do Travis Pitts
Por estes dias encontrava-me na galhofa com as colegas de trabalho, quando a chefe - chefe, ou CEO, ou Chief Supreme Executive Commander, ou que mariquice chamam por estes dias a quem manda na tasca - aproximou-se com um ar sofredor e admitiu, a equipa estava sempre tão bem disposta, ela não conseguia perceber como conseguíamos.
Para início de conversa, a minha chefe tem sempre um ar sofredor, suponho que dorme mal de noite a reflectir o drama de ter um salário tão absurdamente superior a nós, mas a sua sentida confissão fez-me reflectir. Como conseguir esse elevado estado de boa disposição, quando o salário é miserável, os horários tão rígidos que o intervalo tem quinze minutos e direito a repreensão escrita se o esticar até dezassete minutos, com responsabilidades que não são as minhas (o responsável deve estar demasiado ocupado com outras coisas, talvez a praticar o hulla-hoop) não tenho regalias de carro, telemóvel, saúde e seguros, e tenho que lidar, i.e., aturar, clientes que se apresentam com "sou o motorista do presidente do BPI portanto já chega de brincadeira", dizem coisas como "mas eu não falo português?, é a letra X, X de francisco!", e simpaticamente avisam que vão atrás de mim com uma caçadeira ou que me vão regar com gasolina. E sem direito a Internet, claro, nem pensar em carinhosamente ficar a tratar da minha Farm Ville nos minutos vagos. Até porque não existem.
Graças à minha chefe percebi que não tenho nenhum motivo para ficar na risada e fui a correr em lágrimas para casa, para me deitar em posição fetal agarrado ao meu Snoopy de peluche, e espero que esteja orgulhosa de si própria.
A principal diferença entre o Homem e Animal é a capacidade extravagantemente absurda que esses humanos alcançam, não só na arte de pensar, quanto na arte de sentir. Enquanto mesmo um cão, talvez a espécie mais próxima de nós, exprime apenas emoções básicas - alegria, medo, tristeza, surpresa, raiva - qualquer pessoa consegue detonar numa explosão atómica de variedades emocionais. Mesmo as expressões mais simples podem ter diferentes graus de intensidade. O susto pode levar ao medo, o medo ao choque, o choque ao terror; o desconforto pode levar à melancolia, a melancolia à tristeza, a tristeza ao luto. E por aí fora.
Apesar disso, é ainda mais provável que duas emoções surjam juntam, tal como duas cores primárias que são adicionadas para criar uma terceira, e sejam expressas. O nojo e a surpresa levam ao "tu comeste isso?!". A empatia e a tristeza a um "ah, puta que pariu, até a MIM me doeu!". A raiva e a surpresa descambam no "¿¡que cojónes!?" - em espanhol, por supuesto, apenas e não só porque estou a aprender a língua, mas porque é de longe a linguagem mais indicada para peixeiradas e afins.
Mais incrível é termos sentimentos acerca dos próprios sentimentos, e emoções em cima de emoções. O adolescente que em vez de tentar afastar a depressão, enfia-se no quarto a fingir que é dor a dor que deveras sente, e a sentir-se bem por se sentir mal. O desconhecido que manda um espectacular tralho à nossa frente, o que nos faz disfarçar uma gargalhada e sentir mal por nos estarmos a rir. Há, de facto, um imenso universo de possibilidades em todas estas complexidades da Emoção.
Às vezes pergunto-me se será esta a verdade sobre a procura da vida extra-terrestre... Através do xkcd.