Por estes dias encontrava-me na galhofa com as colegas de trabalho, quando a chefe - chefe, ou CEO, ou Chief Supreme Executive Commander, ou que mariquice chamam por estes dias a quem manda na tasca - aproximou-se com um ar sofredor e admitiu, a equipa estava sempre tão bem disposta, ela não conseguia perceber como conseguíamos.
Para início de conversa, a minha chefe tem sempre um ar sofredor, suponho que dorme mal de noite a reflectir o drama de ter um salário tão absurdamente superior a nós, mas a sua sentida confissão fez-me reflectir. Como conseguir esse elevado estado de boa disposição, quando o salário é miserável, os horários tão rígidos que o intervalo tem quinze minutos e direito a repreensão escrita se o esticar até dezassete minutos, com responsabilidades que não são as minhas (o responsável deve estar demasiado ocupado com outras coisas, talvez a praticar o hulla-hoop) não tenho regalias de carro, telemóvel, saúde e seguros, e tenho que lidar, i.e., aturar, clientes que se apresentam com "sou o motorista do presidente do BPI portanto já chega de brincadeira", dizem coisas como "mas eu não falo português?, é a letra X, X de francisco!", e simpaticamente avisam que vão atrás de mim com uma caçadeira ou que me vão regar com gasolina. E sem direito a Internet, claro, nem pensar em carinhosamente ficar a tratar da minha Farm Ville nos minutos vagos. Até porque não existem.
Graças à minha chefe percebi que não tenho nenhum motivo para ficar na risada e fui a correr em lágrimas para casa, para me deitar em posição fetal agarrado ao meu Snoopy de peluche, e espero que esteja orgulhosa de si própria.